Apagou-se um dos mais brilhantes holofotes do cinema francês. Jeanne Moreau, a grande diva da Sétima Arte em França, faleceu em julho com 89 anos. A sua arte, contudo, permanecerá viva eternamente. Poucas mulheres se destacaram como ela – nos palcos, à frente das câmaras ou na vida quotidiana.
Tinha apenas vinte anos quando começou a mostrar os primeiros sinais do seu enormíssimo talento. Era jovem, uma menina muito bonita, com feições de mulher sedutora, confiante e decidida, de tal forma que, aos 16 anos, tomou a decisão de deixar a escola e seguir uma carreira como atriz. Na altura vivia em Paris com a mãe, uma bailarina de ascendência inglesa, num período em que a Cidade Luz não dormia em paz devido aos efeitos da Segunda Guerra Mundial. O pai foi forçado a afastar-se da família devido ao avanço do conflito, o que provocou estragos irreparáveis no casamento, mas a convicção de Jeanne foi superior à turbulência da realidade que a rodeava. Queria ser atriz e, portanto, ingressou no Conservatório de Paris. Aos vinte anos subiu ao palco pela primeira vez, no Festival de teatro de Avignon, e foi muito elogiada pelos colegas e pelo público. Nas semanas seguintes, começou a assumir outros papéis de maior dimensão, até que conseguiu dar o salto para o Cinema, desempenhando pequenos papéis em filmes.
Durante muitos anos, Jeanne Moreau foi equilibrando a sua carreira no Cinema e no Teatro com grande mestria, arrancando elogios pelas suas prestações em ambos. O público começou a conhecê-la e a apreciá-la, querendo mais e acorrendo em massa sempre que a atriz assumia um novo papel ou lançava um novo filme. Amiga das grandes estrelas do cinema e dos maiores realizadores, Jeanne também tinha grande curiosidade em experimentar novas ideias e conhecer outros métodos de trabalho, e por isso, sempre que pôde, deu a mão a novos talentos, como Louis Malle – na década de 50 um completo amador, mas que depois ganhou grande reputação na Sétima Arte. Foi dele o filme “Ascensor Para o Cadafalso”, que teve Jeanne Moreau como protagonista. A artista também ajudou o realizador François Truffaut a ganhar mediatismo, com o filme “Jules et
Jim”. Mas é infindável a lista de nomes com quem trabalhou – Michelangelo Antonioni, Orson Welles, Luis Buñuel, Elia Kazan, Wim Wenders, Carl Foreman e até com o português Manoel de Oliveira, na fita “O Gebo e a Sombra”, lançado apenas em 2012, quando Jeanne já tinha 84 anos.
Como só as grandes artistas conseguem, Jeanne era muitíssimo completa – além de representar, também tinha uma voz imponente que utilizou para gravar algumas canções e lançar alguns álbuns. Moreau chegou inclusivamente a partilhar o palco com Frank Sinatra, e em estúdio divertia-se a compor canções e a escrever letras, dando uso à sensibilidade que a caracterizava e que a todos impressionava. O gosto pela escrita estendia-o à paixão por escrever roteiros e guiões, além de ter produzido e realizado alguns filmes. Em cada uma destas áreas, Jeanne destacou-se com grande profissionalismo. A vida privada foi repleta de altos e baixos. A artista passou por dois casamentos – o primeiro, com Jean-Louis Richard, foi celebrado em 1949 e só terminou em 1964, mas o segundo, com o realizador norte-americano William Friedkin, só aguentou dois anos, de 1977 a 1979. Pelo meio, foi tendo outras paixões, sendo célebre o amor que sentiu pelo ator Tony Richardson, cuja mulher largou para tentar construir uma relação sólida com a atriz, ainda que nunca tivesse sido celebrado o casamento. Além deles, Jeanne enamorou-se pelos seus realizadores Louis Malle e François Truffaut, pelo designer Pierre Cardin e por outras personalidades do mundo do espetáculo. Aos 89 anos, depois de cinco anos afastada do mundo das artes, Jeanne Moreau faleceu, em Paris. O desaparecimento físico não foi acompanhado do desaparecimento do legado que ela nos deixou – mais de 70 participações em filmes e dezenas de prémios ganhos, incluindo o de Melhor Atriz no Festival de Cannes.
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